
Daniel Ortega e Presidente Jimmy Carter (Casa Branca,1979)
Para Ronald Reagan, Ortega era um marxista perigoso – um “pequeno ditador” apoiado pela União Soviética – e um protagonista no drama da Guerra Fria dos anos 1980.
Agora com 76 anos e em seu quarto mandato como presidente, Ortega perdeu o uniforme e os óculos. Seu cabelo está ralo, e ele fala pouco acima de um sussurro. E, no entanto, para muitos, esta encarnação de Ortega é a mais perigosa de todas.

Ele vem empreendendo ataques impiedosos e sangrentos contra manifestantes que querem que ele renuncie, levando muitos a comparar o ex-comandante guerrilheiro à ditadura que ele ajudou a derrubar há 40 anos.
DANIEL ORTEGA
José Daniel Ortega Saavedra, nasceu em 11 de novembro de 1945 em La Libertad, Nicarágua, era filho de um sapateiro e ainda adolescente ingressou na Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN), de esquerda, em seu país.
O grupo lutou contra a ditadura de Anastasio Somoza García, cuja família governava o país desde 1936.

Daniel foi escoteiro, coroinha, até se fazia passar por padre, era indisciplinado, queimava veículos, apedrejava casas e pessoas, agredia e matava, foi preso, viveu no exílio, era um guerrilheiro, coordenou o Conselho Diretivo da FSLN, foi quatro vezes presidente e, finalmente, se tornou um ditador igual ou pior do que aquele que ajudou a derrubar em nome dos ideais revolucionários.
Daniel Ortega nunca foi o líder sandinista mais carismático. Ele não era um grande estrategista militar; seu irmão mais novo, Humberto, que se tornou ministro da Defesa, era conhecido por isso. Tampouco era o ideólogo marxista mais zeloso entre seus camaradas. Ele tinha a reputação de ser um construtor de consenso pragmático.
A PRISÃO
Depois de roubar bancos para financiar a revolução, Ortega passou sete anos na prisão, onde sofreu tortura e abusos. O homem que surgiu em 1974 era conciso, retraído e desconfiado, segundo pessoas que o conheceram na época.
Ortega arrasta consigo a prisão por toda a vida. Em sua primeira escolta pessoal, ele incorpora pelo menos três de seus ex-carcereiros. Seu pseudônimo mais usado, “Enrique”, é o nome de um dos guardas com quem fez amizade na prisão.
Seus amigos mais próximos são aqueles com quem dividiu a prisão e fez de seus hábitos de prisioneiro sua marca pessoal de governo e inter-relação com os outros. O Daniel Ortega de hoje, porém, não se explica sem Rosario Murillo. Ambos se complementam. Ortega encontrou em Rosario o que lhe faltava. E ela encontrou em Ortega o veículo que precisava.

PRESIDENTE
Depois que os sandinistas derrubaram o governo em 1979, Ortega conseguiu entrar na junta governante e conquistou a presidência em 1984. Ele emergiu como líder em parte porque era visto como alguém que não imporia sua vontade aos outros.
Muitos opositores acusam os sandinistas de antidemocráticos, pois o governo censurou a mídia, aparelhou o conselho eleitoral e usou o controle sobre cartões de racionamento para incentivar a lealdade ao partido. Naquela época, como agora, Ortega tinha a reputação de ser um líder intransigente, um homem interessado em manobrar os rivais, mas que delegava com frequência. Atualmente, sua esposa frequentemente realiza reuniões com ministros e fala em nome do governo.
“Ele nunca foi alguém que governa”, relata Mónica Baltodano, uma ex-guerrilheira que lutou ao lado de Ortega e é historiadora. “Ele viajou muito pelo interior. E parte da força de sua liderança reside nesses anos e nos vínculos que desenvolveu com as massas sandinistas e o povo em geral”.
2006 – 2022: ORTEGA RETORNA E CONSOLIDA PODER
O Ortega que reconquistou a presidência em 2006 – depois de perder três eleições consecutivas – abandonou o marxismo, abrandou o antiamericanismo e ampliou sua conversa sobre paz e valores cristãos.
Ele estendeu a mão para o setor privado e cultivou o investimento estrangeiro. Centenas de milhões de dólares em petróleo venezuelano barato fornecido pelo governo de Hugo Chávez encheram o orçamento e impulsionaram os programas sociais. A Nicarágua, que continua sendo o segundo país mais pobre do hemisfério de acordo com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (os dados mais recentes são de 2018), depois do Haiti, teve um crescimento médio anual do PIB de mais de 4% nos 10 anos seguintes.
ACUSAÇÕES
Houve acusações persistentes de fraude em nome dos apoiadores de Ortega na votação de 2006 e nas seguintes. Quando ele venceu em 2011, a missão eleitoral da União Europeia disse que a votação era “opaca e arbitrária”.
Antes da votação de 2016, os aliados de Ortega na legislatura mudaram a constituição, eliminando os limites de mandato. A Suprema Corte também impediu um dos principais candidatos da oposição, Eduardo Montealegre, de participar da eleição, e o Conselho Supremo Eleitoral forçou 16 parlamentares da oposição a deixarem seus assentos. Ortega recusou-se a permitir a entrada de observadores eleitorais independentes na Nicarágua.
SINAIS
A partir de 2007, com o retorno de Ortega ao poder, a rápida escalada da violência chocou a muitos, entretanto os sinais de alerta haviam iniciado há muito tempo. Ao longo de sua carreira política Ortega desprezou a democracia várias vezes, preferindo aproveitar todas as oportunidades para seu partido sandinista garantir o governo perpétuo por meio de fraudes nas urnas, instituições repletas de apoiadores e mudanças na constituição.
“O Ortega de hoje não é reconhecível para quem o conheceu”, já disse, repetida vezes, Henry Ruiz, um dos companheiros de guerrilha de Ortega e ex-membro do gabinete.
TUDO NOSSO
Ortega governa a Nicarágua com um pequeno grupo de familiares e partidários. Ele fez de sua esposa, Rosario Murillo, sua vice-presidente. Juntos, eles promoveram uma imagem em outdoors e transmissões governamentais como pais beneficentes da nação. Seu partido sandinista, que começou como um grupo guerrilheiro na década de 1960, tornou-se um substituto para o estado: em uma passagem de fronteira para a Costa Rica, bandeiras sandinistas pretas e vermelhas tremulam, mas não a bandeira azul e branca da Nicarágua.
MANIFESTAÇÕES CONTRA ORTEGA
Os distúrbios sociais que se iniciaram em 2018 e que deixaram mais de 260 mortos, de acordo com a Comissão Interamericana de Direitos Humanos foi atribuída por Ortega a golpistas apoiados pelos Estados Unidos. Ele tem alguma experiência nessa área: na década de 1980, a CIA criou secretamente um exército rebelde, conhecido como “Contras”, para tentar derrubar seu governo. Ele agora afirma que neutralizou todas as ameaças contra ele e que recuperou o controle sobre todas as cidades.
REFERÊNCIAS
SANCHEZ, Fabian Medina. El Preso 198: Un Perfil de Daniel Ortega. México: La Prensa, 2018.
KINZER, Stephen. Blood of Brothers: Life and War in Nicaragua. Estados Unidos: Harvard University Press, 2007.
BALTODANO, Mónica. Legalidad, legitimidad y poder en Nicaragua. Managua: Fundación Friedrich Ebert, 2004.
Respostas de 2
Que texto sensacional! Vocês estão de parabéns.
Olá, Rodrigo, tudo bem?
Que legal que vc gostou, obrigado por sua participação!
Grande abraço,
Prof, Jorge Luiz.